Uma brasileira que deixou o país após sofrer ameaçadas por ser praticante do candomblé obteve uma vitória na Justiça americana. A Corte de Apelações do 9º Circuito, sediada na Califórnia, reconheceu que ela tem o direito de solicitar asilo nos Estados Unidos por perseguição religiosa.

A decisão, unânime entre os três juízes do colegiado, revoga pareceres anteriores da Justiça de imigração do país que haviam considerado os ataques sofridos por ela como episódios de discriminação -o que seria insuficiente para caracterizá-la como elegível a condição de refugiada.
A brasileira começou a frequentar cultos de candomblé ainda na adolescência, sem o conhecimento dos pais católicos.

Em 2010, segundo o processo, ela teve sua casa invadida por agressores que mataram seu pai e chamaram os moradores de “bruxas” e “feiticeiras”.
Desde então, a brasileira passou a sofrer ameaças constantes. Pichações ofensivas surgiram na fachada da casa. Ela e o marido enfrentaram dificuldades para conseguir emprego e os filhos foram alvo de bullying na escola.

O novo entendimento na Justiça dos EUA reconhece que a brasileira e sua família podem correr risco de morte caso retornem ao Brasil.

Segundo o tribunal, há “fartas evidências” de que a brasileira foi alvo de “assédio, vandalismo recorrente e em escala crescente, além de uma ameaça de morte durante uma invasão domiciliar armada”, o que a obrigou a abandonar sua religião ou praticá-la de forma clandestina antes de deixar o país.
A decisão determina que o caso seja reavaliado pelo Conselho de Apelações de Imigração (BIA, na sigla em inglês), que deve reconsiderar provas que haviam sido ignoradas anteriormente, como registros de ataques a terreiros em diferentes estados brasileiros.

O caso da brasileira se insere em um contexto mais amplo de crescimento da violência religiosa no Brasil. Segundo dados citados pelo relator do processo, juiz Richard Paez, a hostilidade contra religiões de matriz africana aumentou quase dez vezes entre 2016 e 2019. Só em 2019, mais de 200 terreiros fecharam as portas por causa de ameaças -o dobro do registrado no ano anterior.
De acordo com Paez, parte dessa violência está associada ao avanço do fundamentalismo religioso no país, inclusive com envolvimento de facções criminosas em regiões de forte presença evangélica.

Ela vive atualmente em Tracy, cidade no condado de San Joaquin, na Califórnia, com o marido e o filho de 9 anos. Outros dois filhos permanecem no Brasil, sob os cuidados da avó materna. O marido e o filho mais novo são listados como beneficiários em seu pedido de refúgio.

Em setembro de 2021, ela foi surpreendida por um homem encapuzado que invadiu sua casa e a ameaçou com uma arma. “Bruxa, saia desta cidade com sua família da macumba. Isso é só um aviso. Da próxima vez, você não vai sobreviver”, teria dito o agressor.
Mesmo com esse histórico, seu pedido inicial de asilo foi negado por um juiz de imigração, que argumentou que a brasileira não teria sofrido ferimentos físicos duradouros e que sua alegação de perda de oportunidades de emprego por causa da religião era “especulativa”.

A Corte federal de apelações, no entanto, afirmou que a Justiça de imigração falhou ao não reconhecer o padrão de perseguição sistemática contra religiões de matriz africana no país. Segundo o novo entendimento, cabe agora ao governo norte-americano demonstrar que a brasileira e sua família estariam seguras caso retornassem ao Brasil.

By Laiana

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